Sob o prisma do volante



A vida de caminhoneiro já embalou muitos sonhos nesse Brasil que anda sobre rodas. A vida meio nômade dos profissionais do volante proporciona a eles aventuras, mescladas de desventuras. As fases de um caminhoneiro solitário, na direção do seu caminhão são dividas em três partes que envolvem a alegria da partida logo após fechamento da negociação do frete, o percurso a ser vencido que é o que acarreta maior tensão devido a riscos como, quebra acidentes, assaltos e outros perigos inerentes a profissão e a chegada no destino estabelecido que culmina na sensação do dever cumprido.
Depois soma-se isso em ordem inversa e temos a parte mais gratificante que e o retorno ao lar. Nada na vida de um caminhoneiro nada pode ser comparado com a sensação de felicidade de chegar a casa. De ver os portões se abrirem vislumbrar as primeiras imagens dos filhos ou da esposa, enquanto estaciona e cala o motor do possante. Na seqüência desses acontecimentos vêm os sorrisos e abraços de boas vindas dos filhos e da amada, o que proporciona a ele a certeza do fim de mais uma jornada. Portanto é com a experiência de 12 anos atrás do volante que eu afirmo que, para um caminhoneiro de família estruturada esse momento é apoteótico, por que junto com a satisfação da chegada vem também todo o desgaste provocado pela tensão da viagem. A partir desse momento todo o cansaço da viagem se manifesta e o marmanjo fica dengoso e passa a desfrutar as atenções da família.
Vamos voltar à estrada que é onde se escreve boa parte da vida do caminhoneiro, onde eu já tive que puxar meu bruto para esquerda pra não atropelar uma ema enorme, já auxiliei fui auxiliado por pessoas até então desconhecidas. Nestas estradas já viajei de encontro ao sol nascente, vendo-o brotar por trás das serras, visão que em qualquer estação do ano já vale o ingresso na existência. Pude me deleitar com visão dos vários animais silvestres e dos ipês no auge da flora que se encontram raramente na margem das estradas (e talvez por serem raros) constitui uma visão impossível de ser ignoradas. Enfim qualquer pessoa com alguma sensibilidade pode se deleitar com as belezas e as nuances que a natureza pode proporcionar ao estradeiro do volante.
Na estrada acontecem fatos que apesar de bizarros tem o seu ar engraçado e isso sucedeu comigo. A mais ou menos oito anos sai de são Sebastião com destino a formosa entre as 18 e 19 horas. Percurso de ida foi tranqüilo apesar de um pedestre bêbado ter surgido cambaleando na minha frente pelo acostamento no ápice de uma subida na DF 001. Por ter partido à tarde só fui concluir processo, viagem e descarga as 21: h00min em formosa, o que me fez tomar a decisão de dormir na cabina do caminhão e partir de volta as 05h00min da manha seguinte. Estacionei o mercedão enfrente uma pensão, desci do bichão e a adentrei, me aproximando do balcão e entabulando uma conversa com o proprietário.
Lembro-me bem que, estava acontecendo uma partida entre palmeiras e o Vasco que culminou com a derrota (infelizmente) do primeiro. Bem pra relaxar enquanto me preparava para jantar pedi ao dono da pensão uma dose de conhaque para matar o bicho e abrir o apetite, notei com certa consternação que a referida dose foi muito pequena (coisa de pouco mais um dedo), mas tudo bem aceitei sem reclamar e estendi a conversa entrando na historia da vida do homem e passando ao mesmo alguma informação sobre a minha fazendo-o saber que eu era natural da cidade etc. e tal. Percebendo eu que estava havendo uma certa empatia entre eu e o referido senhor solicitei a ele que me servisse mais uma dose que foi servida na mesma proporção da primeira. Foi ai que eu aproveitando, a por mim, suposta camaradagem criada fiz uma observação a respeito, recebendo dele a seguinte resposta: - amigo a sua prosa esta tão boa que para evitar que você fique bêbado vá dormir e me deixe sozinho eu estou regrando nas doses. Então dado o adiantado da hora e minha falta de argumento ingeri o meu segundo quarto de dose me dirigi à estufa do selv-service para me servir da comida do tipo caseira e por sinal delicioso. Jantar concluído me retirei para a cabina do bruto e fui dormir.
Acordei as 05h00minhoras e retomei o caminho de volta. No retorno após ter acessado marginal do Paranoá resolvi abrir o quebra-vento para respirar o ar Puro do pinheiral ao lado então junto com o ar entrou também uma rajada de um dos produtos denominado pelos ornitólogos como guano ou merda de pássaro que é um negocio super ultra hiper fedorento e me atingiu no lado esquerdo da face. Já sobre aquele comentário do cantineiro sobre minha simpatia ate hoje paira uma duvida,... Estava ele sendo sincero? Acho que não se ele tiver partido do pressuposto de que todo consumidor de álcool é um grandessíssimo F DA P. partindo desse ponto de vista, comentário daquele senhor, terá sido com certeza a mais refinada das ironias.
Quanto a mim após receber nas fuças as fezes do pássaro desconhecido, conduzi o possante às duras penas por mais ou menos 2 km, até as margens da barragem do. lago Paranoá onde fiz uma higienização de emergência e rumei para segurança do meu lar, para os braços dos meus entes queridos, para os quais narrei minha desventura onde exceto por alguns risinhos de deboche, fui cercado pela costumeira atenção que sempre me é dispensada em todas as situações de regresso

0 comentários:

Postar um comentário